Imagine receber sua aposentadoria com aquele valor já contado e descobrir, do nada, que parte do dinheiro sumiu todo mês sem explicação. Foi assim com Aurecy de Lima, aposentada de Fortaleza, que em outubro de 2024 percebeu um desconto mensal de cerca de R$ 45 para uma associação que ela nunca tinha ouvido falar. E não foi só ela: outros aposentados e pensionistas do Ceará sentiram o mesmo baque, pegando todo mundo de surpresa — uma situação que escancarou o tamanho do problema das associações fantasmas agindo no INSS.
Esses descontos indevidos não foram poucos nem novidade. O caso da Aurecy, por exemplo, foi só um dos muitos. Ela correu atrás de cancelamento no app Meu INSS, reclamou no Procon, mas o desconto seguiu firme por mais dois meses. Um acordo judicial prometeu ressarcimento em dobro, lá em fevereiro de 2025, mas até abril a promessa era só isso mesmo: promessa. E nesse meio tempo, milhares de beneficiários passaram pelo mesmo drama de conta furada, esperando por soluções que custam a chegar.
Outra vítima, Raniele Menezes, de 30 anos, acumulou perdas mais altas: viu descontos de R$ 37,65 aparecendo em seu benefício de pensão entre 2015 e 2020, que depois voltaram entre 2023 e 2025, e ainda outros valores menores, como R$ 17,45 picotando sua renda. No fim das contas, mais de R$ 2 mil foram parar no bolso das tais associações ‘aapb 0800 111 0099’, nomes que soam estranhos para qualquer um — especialmente para quem nunca quis ser associado de nada.
A Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União começaram a puxar esse fio desde 2019. A cada detalhe investigado, o rombo só aumentava: a estimativa é de um desvio que poderia alcançar R$ 6,3 bilhões. O golpe funcionava de um jeito covarde mesmo: as associações fantasmas criavam registros falsos usando os dados dos próprios beneficiários e metiam consignações não autorizadas direto nos benefícios do INSS.
Para a galera mais velha, que muitas vezes confia no contracheque e nem entende direito de onde vieram os descontos, era difícil perceber o prejuízo logo de cara. Não existe aviso, não tem consulta prévia — simplesmente o dinheiro some como mágica, mas só mesmo para quem gosta de ilusionismo barato.
A Justiça Federal do Ceará percebeu que só conversa de gabinete não ia resolver. Em fevereiro de 2025, organizou encontros com representantes do Judiciário, de órgãos públicos e da própria sociedade civil para criar ações coordenadas e reagir de verdade aos abusos. O desafio, no entanto, está em executar decisões e garantir que as vítimas — a maioria idosos que dependem daquele valor — recebam o dinheiro de volta, sem poeira sendo varrida pra debaixo do tapete.
O escândalo deste esquema vai além dos números impressionantes. Ele desafia o próprio sistema de proteção dos aposentados e pensionistas do INSS no Ceará e acende o alerta para quem acredita que burocracia sempre anda do lado da honestidade. A sensação de impotência, somada à demora em resolver cada caso, só reforça a urgência por mudanças mais garantidas no acompanhamento e controle dos benefícios previdenciários.
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